terça-feira, 10 de novembro de 2015

ANJO LINDO


Era um dia quente, e o vento, já exaurido de tanto trabalho naquele verão, resolveu se dar algum descanso, pois também era filho de Deus. As nuvens saíram para passear e aproveitar o sol. E só restou aquela singela árvore, quase sem copa, a fazer sombra àquela figurinha esguia, que de longe só se via o sorriso imenso e quente, cheio de carinho.

Seus bracinhos eram leves e dava medo de quebrar ao toque. Sua ternura, por outro lado, impelia a um abraço apertado, desses de esmagar as costelas. Mas suas costelinhas, tão crocantes, tão delicadas, tão raras e receptivas, com certeza não aguentariam tal demonstração de apreço.

Ela me fazia pensar como a verdadeira beleza é frágil. E como o verdadeiro toque de amor deve ser ao mesmo tempo seguro e cuidadoso.

Muitas vezes no afã de se grudar a quem se ama, acaba-se machucando de forma irreversível o fino e delicado sentimento que buscamos. Por isso as rosas têm espinhos, únicas proteções para suas aveludadas e cheirosas pétalas, tão agradáveis ao tato, tão deliciosas ao olfato, tão realizadoras aos olhos, tão completas aos sentidos.

Ela era assim, como uma rosa rubra desnuda de espinhos. Um flor delicada e rara em meio ao jardim ensolarado e quente.

Sua silhueta tão tênue disputava espaço na grama com a sombra daquela pequena árvore que dançava estática enquanto crescia no decorrer de seus poucos anos de vida. E cada dedinho seu fazia lembrar a aurora, a cada doce despertar.

Não contive o palpitar de meu coração, que tomado pela beleza, batia certo em sua direção. Não contive o andar de minhas pernas, o suor de meu rosto, meu olhar apaixonado, que ensaiava palavras que não chegaram a nascer.

Ela me viu, sorriu, seus olhos brilhavam e eram um caminho de luz a ser percorrido pela eternidade.

Aproximei-me com muito cuidado daquele anjo vestido de gente. Apenas o suficiente para, observando-o, não assusta-lo. E cada passo na grama era uma vida inteira de possibilidades que invadiam minha mente e devastavam meu corpo em ondas de emoções.

Nem cheguei a toca-la.

Sem espinhos, meu anjo partiu.

E voa por aí nas asas do vento.

Mora para sempre no mais profundo e forte pulsar de meu coração.

Nenhum comentário:

Postar um comentário